Portaria eletrônica. Lá estava eu pro almoço de natal na casa da tia e aguardava o “alvará” para entrar no prédio.

Todos já me esperavam e eu aguardava a musiquinha do interfone, na calçada, após ter passado meus dados.

Neste ínterim, vem em minha direção uma antiga professora do cursinho, que mora no prédio e eventualmente nos cruzamos.

Enquanto ela abria os 2 portões para sair, nos cumprimentamos, desejamos feliz natal. E nisso ela me ofereceu passagem, e aproveitei para já seguir o caminho de entrada no prédio.

Acontece que esta passagem é aquela gaiola, composta por 2 portões. Você só consegue abrir o segundo portão depois que fecha o primeiro. Ótimo, eu entrei, ela saiu, e o primeiro portão se fechou. Fiquei tentando abrir o segundo portão e adivinha… Não abria.

Nisso, ficou aquela situação constrangedora, em que a professora não sabia se ia embora, me perguntava de dentro do carro de carona dela se estava dando certo. Eu confiante falei que ainda não, mas que ia dar. Que ela podia ir embora tranquila.

E enquanto o segundo portão não abria, e eu via a cena de ela quase indo embora, titubeei em pedir para ela voltar para abrir para mim, ou para tocar novamente o interfone (pois de dentro da gaiola não se acessa o interfone que agora é digital e não tem um “botão” palpável e sim um touch que só dá para ver de frente para ele.) Mas não o fiz, a voz do interfone ressurgiu me dizendo que eu ainda não estava liberada.

A sorte foi que em pouco tempo, apareceu o marido da minha prima para abrir para mim e finalmente consegui prosseguir o meu caminho até a famigerada mesa de almoço de natal.

Essa cena seria apenas mais uma do cotidiano, se não remetesse tão concretamente a uma conversa que tive com essa mesma professora na época do cursinho.

Falei a ela, lá em 2004, que ali no cursinho eu me sentia como o personagem interpretado por Tom Hanks no filme “O terminal”.

No filme o personagem tenta ir de seu país europeu para os Estados Unidos, porém quando chega ao aeroporto americano, seu país sofre um golpe de estado e seu passaporte é invalidado.

Com isso ele não é autorizado a entrar nos Estados Unidos mas também não consegue voltar a seu país de origem, que fechou as fronteiras.

Então ele passa a viver no aeroporto, no caso, chamado de terminal, e precisa se virar para conseguir comer, dormir, enquanto está preso neste “lugar nenhum”.

E é assim que eu via o cursinho, como um “não lugar”, onde eu já havia saído do ensino médio, mas ainda não tinha engrenado na graduação. Não há como voltar, mas ainda também não há como prosseguir.

E essa cena de estar presa na gaiola do portão, novamente sob o olhar da mesma professora que me testemunhou “presa” no cursinho, tal qual no filme “O Terminal” que comentamos, me fez compreender algumas coisas.   

Que ninguém pode nos tirar das fases e processos que ainda precisamos passar, mesmo que essa pessoa tenha “a chave”. No caso lá na época do cursinho, ela tinha o conhecimento que eu precisaria para passar no vestibular, ou seja, tinha a chave. Mas não poderia abrir a porta para mim.

E na situação do natal a mesma coisa, eu precisaria aguardar a resposta da moça do interfone e tentar pular etapa não ajudou.

Quantas vezes empacamos em uma situação achando que certa pessoa precisa nos “salvar” ou nos ressentimos que alguém que passou por nós não nos ajudou? Quando na verdade o tempo nosso em cada processo tem a ver com a evolução de nossos ciclos e não com outro ser humano, que também está fluindo nos ciclos deles.

Isso me lembrou a música da Zélia Duncan, a qual deixo para reflexão:

“Eu sou seu corpo mais forte
Seu alvo atingido
Sua semente que nasceu
E não consegue
Te dar o fruto doce, já crescido, eu não sou eu”

(Eu não sou eu – Zélia Duncan)


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